Sarjeta do Terror #34 – Monstro do Pântano (parte 1 de 2)

Nesta edição de Sarjeta do Terror, a primeira parte da matéria sobre Monstro do Pântano, um dos personagens de terror mais reconhecidos da DC Comics.

Poucos personagens de terror nas HQs possuem tanta importância quanto o Monstro do Pântano. Um dos responsáveis por colocar editoras que antes se dedicavam mais aos super-heróis entre as grandes provedoras de conteúdo “adulto”, o personagem até hoje ocupa um lugar de respeito entre os fãs de quadrinhos.

Origens

Originalmente, o Monstro do Pântano era Alex Olsen, um cientista do inicio do século 20 que foi pego numa explosão causada por seu colega de trabalho, que queria matá-lo a fim de conseguir casar com Linda, esposa de Olsen. Ao se jogar no pântano em desespero, Olsen acabou sendo alterado pelos químicos aos quais foi submetido na explosão e pelas propriedades do pântano, tornando-se uma criatura bizarra. Olsen consegue sua vingança, matando o ex-colega antes que ele pudesse conseguir matar Linda, mas como não conseguiu fazer com que sua esposa perceba sua verdadeira identidade, vai embora, de volta ao pântano, seu novo lar.

A história foi publicada em House of Secrets # 92, em 1971. A história, escrita por Lein Wein e Bernie Wrightson, teve sucesso imediato. Alguns meses depois, uma série regular do personagem foi encomendada, mas os editores preferiram atualizar a história e tornar o personagem um pouco mais “heróico”, a fim de justificar o fato de ser protagonista da série. E então a revista Swamp Thing foi publicada, com a origem do Monstro recontada e adaptada para os anos 70.

Assim, a revista começou a contar a história de Alec Holland, um cientista que trabalhava num laboratório da Louisiana numa fórmula bio-restauradora capaz de “gerar florestas em desertos”, mas é que sabotado quando uma bomba plantada no laboratório por agentes de um misterioso Mr. E, que queria a fórmula, explode. Ao receber a explosão, Holland corre para fora do laboratório e acaba caindo no pântano, enquanto pegava fogo. Um tempo depois, Holland emerge do pântano como uma criatura humanóide-vegetal, que seria conhecida como “Monstro do Pântano”.

Len Wein foi o escritor pelo primeiro ano da revista, sendo depois substituído por David Micheline e Gerry Conway. Durante a fase de Wein, as histórias giravam geralmente em torno do sobrenatural e do insólito. Com a entrada de Micheline, as histórias passaram a contar com diversos elementos de ficção científica e aos poucos foram ficando cada vez mais parecidas com histórias típicas de super-herói. Após um bizarro e inútil arco (escrito por Gerry Conway), onde Alec Holland volta a ser humano, a revista é cancelada. A última edição da revista contava com uma história de Alec Holland, já humano novamente (mas curiosamente o Monstro do Pântano, que não aparece em nenhum momento na história, está na capa da revista).

O elemental

No início dos anos 80, a revista Swamp Thing já havia sido cancelada devido às baixas vendas. Mas era tarde demais para esquecer o personagem, uma vez que uma adaptação cinematográfica estava à caminho dos cinemas. Para aproveitar-se do hype que seria gerado com o filme, a DC retornou ao personagem, com a revista Saga of the Swamp Thing, onde contratou Martin Pasko para escrever o personagem. Pasko tomou como base a última história onde o personagem havia aparecido (em um crossover com os Desafiadores do Desconhecido), que o mostrava como uma espécie de lenda urbana, e seguiu a partir daí. As histórias onde ele voltava a ser humano e que terminaram (literalmente) a revista foram ignoradas e deixaram de ser canônicas. Mesmo com melhora em relação às últimas histórias (e um filme nos cinemas), Monstro do Pântano não alcançava a popularidade, o que motivou a DC a agitar um pouco as coisas.

A editora decidiu, então, dar uma chance para um novato escritor britânico, dando-lhe liberdade total para trabalhar com o personagem. Alan Moore passou a ser escritor regular. Em sua edição de estréia, vemos o Monstro do Pântano sendo caçado e encontrado pelo exército, onde acaba alvejado e supostamente morto. Apesar de Moore ter iniciado na edição 20, foi a partir da edição de número 21 que sua fase do Monstro do Pântano se tornou um clássico. Nela, o Monstro do Pântano descobre que nunca foi Alec Holland e sim uma criatura vegetal que pensava ser Alec Holland. A partir daí, Moore desenvolveu uma rica mitologia ao redor do personagem, trouxe a volta de antigos vilões, transformou-o num elemental que era nada mais do que a encarnação de todo o verde e revitalizou o personagem de uma forma que teria sido impensável por outros autores até então. Outro ponto interessante da fase de Moore foi ter incluído a primeira origem (aquela publicada em House of Mistery #92) dentro da mitologia do personagem, quando ele descobre o parlamento das árvores, uma “sociedade” formada por entidades que anteriormente já foram elementais como o Monstro do Pântano, e agora estão “aposentados”, tendo como principal missão manter o equilíbrio do verde. Alex Olsen, o Monstro do Pântano “original”, é uma das entidades que hoje faz parte do parlamento.

Moore levou o personagem para os destinos mais inusitados: de encontros com super-heróis da DC ao fim do mundo, o Monstro do Pântano enfrentou vampiros, casas mal-assombradas, lobisomens, bruxaria, foi até o inferno buscar sua amada, retornou para enfrentar o fim de tudo, morreu mais de uma vez e até foi para o espaço. Na fase de Moore, cada edição era uma (ótima) surpresa. Personagens subaproveitados ou esquecidos pela editora foram magistralmente revitalizados nas histórias (como o Homem Florônico), alguns voltando a aparecer em outras hqs, assim como novos personagens surgiram nas páginas da revista e alguns até se tornaram mais famosos que o próprio Monstro do Pântano (como John Constantine). O personagem também participou da saga Crise Nas Infinitas Terras.

Moore escreveu o personagem por praticamente 4 anos e esta fase foi responsável por revitalizar o gênero de terror nos quadrinhos mainstream, além de ter sido a primeira HQ que ignorou completamente o Comics Code Authority e tinha como público os adultos, o que incentivou a criação do selo Vertigo (que publica apenas quadrinhos voltados para o público adulto).

Curiosidades:
– Len Wein antes havia sido escritor do Homem-Coisa, personagem da Marvel com premissa bastante similar ao do Monstro do Pântano, mas lançado um ano antes. Gerry Conway, um dos criadores do Homem-Coisa – e que iria escrever posteriormente o Monstro do Pântano), atentou para o fato, mas Wein se recusou a alterar a origem do personagem;
No entanto, a Marvel nunca pensou em processar a DC por plágio, e por um motivo muito simples: ambos estão longe de serem a primeira “criatura do pântano” dos quadrinhos. The Heap, que surgiu na revista Air Fighters, é de 1947 e há um conto chamado “IT”, de Theodore Sturgeon e publicado em 1940 que foi mais tarde adaptado para os quadrinhos em “Supernatural Thrillers”, da Marvel Comics;
– Outra curiosidade é que Gerry Conway (criador do Homem Coisa, e que posteriormente escreveria Monstro do Pântano) e Len Wein (criador do Monstro do Pântano e que já havia escrito o Homem Coisa) eram colegas de quarto na época;
– O Morto do Pântano, personagem brasileiro similar criado por Eugênio Colonnese, foi criado 5 anos antes, tanto do Homem Coisa quanto do Monstro do Pântano;
– Monstro do Pântano foi publicado no Brasil pela primeira vez em uma revista chamada “Estréia”, pela editora Ebal. Apesar de não ser o único personagem da revista, era sempre ele que aparecia nas capas;
– Originalmente, o Monstro do Pântano não falava. Os balões de diálogo eram substituídos por balões de pensamento para sabermos o que estava se passando na cabeça do personagem;
– Monstro do Pântano não demorou para encontrar outros personagens da DC. O primeiro foi Batman, seguido por outros, como Desafiadores do Desconhecido e Gavião Negro;
– Curiosamente, o encontro do Monstro do Pântano com Gavião Negro deveria ser publicado na edição 25 da revista. Como ela foi cancelada no número 24, a história acabou levando meses para ser publicada em outra revista;
– As capas da revista eram um dos pontos fortes durante a fase de Moore. Magistralmente pintadas como as capas de terror de antigamente, lembrando verdadeiras obras de arte, era fácil querer arrancar aquelas capas, emoldurar e pendurar pela casa;
– Alan Moore sempre foi um “rato de banca” e sempre admitiu gostar de personagens obscuros. Talvez por isso ele tenha trazido quase todos eles para as histórias do Monstro do Pântano. Personagens esquecidíssimos como Sargon, o Mago, Barão Von Winter e Dr. Oculto voltaram a dar as caras na revista, mas foram sumariamente esquecidos novamente depois;
– O parlamento das árvores, criado por Moore, era uma homenagem aos “monstros do pântano” surgidos nos quadrinhos antes da criação de Alec Holland, o que incluía sua versão original como Alex Holland no século 19, mas também versões de personagens como The Heap e o Homem-Coisa.

 

Edições anteriores:

33 – Criadores de Terror: Bernie Wrightson

32 – Super-heróis com um “pé” no terror: Doutor Estranho

31 – Os 70 anos de Eerie #1

30 – Plantão Sarjeta do Terror – Sombras do Recife

29 – Criadores de Terror: Rodolfo Zalla

28 – Da TV para os quadrinhos: Além da imaginação

27 – Vigor Mortis Comics – Volume 1

26 – Super-heróis com um “pé” no terror: O Espectro

25 – Warren Publishing: Contornando o Comics Code

24 – Prontuário 666, os anos de Cárcere de Zé do Caixão

23 – Da TV para os quadrinhos: Arquivo X

22 – Criadores de Terror: Eugenio Colonnese

21 – Terror nas grandes editoras, parte final

20 – Terror nas grandes editoras, parte 2

19 – Uzumaki

18 – Terror nas grandes editoras, parte 1

17 – Do cinema para os quadrinhos: Evil Dead/Army of Darkness

16 – Terror no mundo real: o Comics Code Authority, parte final

15 – Super-heróis com um “pé” no terror: Doutor Oculto

14 – Terror no mundo real: o Comics Code Authority, parte 1

13 – Da TV para os quadrinhos: Elvira, a Rainha das Trevas

12 – EC Comics , epílogo: O Discurso Contra a Censura

11 – Criadores de Terror: Salvador Sanz

10 – EC Comics, parte 3: o fim

9 – Super-heróis com um “pé” no terror: Homem Formiga

8 – Interlúdio: Shut-in (trancado por dentro)

7 – EC Comics, parte 2: o auge

6 – Interlúdio: Garra Cinzenta, horror pulp nacional

5 – EC Comics, parte 1: o início

4 – Asilo Arkham: uma séria casa num sério mundo

3 – A Era de Ouro dos comics de terror

2 – Beladona

1 – As histórias em quadrinhos de terror: os primórdios

Autor: Amanda Paiva

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