Sarjeta do Terror #44 – Criadores de Terror: Reed Crandall

Nesta edição, conheça um pouco sobre Reed Crandall, que fez história nos quadrinhos por seu estilo mais realista, em comparação com o estilo mais cartunesco que era o paradigma de sua época.

Muitos foram os artistas que fizeram história nos quadrinhos de terror. Infelizmente, nem todos são tão conhecidos hoje em dia quanto Frank Frazetta, Steve Ditko, Esteban Maroto ,para citar alguns. Por essa razão, decidi que essa nova edição seria sobre um desses grandes artistas hoje esquecidos: Reed Crandall.

Reed Crandall nasceu na cidade de Winslow, Indiana, em 1917. Através de uma bolsa de estudos, conseguiu estudar na Cleveland School of Art, em Ohio e começou a trabalhar com ilustrações através de parcerias com colegas de estudos, pintando vitrines e desenhando mapas e material de apoio para as publicações da Newspaper Enterprise Association. Suas principais influências eram N.C. Wyeth, Howard Pyle e James Montgomery Flagg, ilustradores clássicos nos EUA conhecidos pela versatilidade e principalmente pelo realismo nos seus desenhos.

A intenção de Crandall era se tornar ilustrador de revistas em tempo integral, o que acabou não dando certo, mas o levou a ilustrar livros infantis. Se mudou para Nova York em 1939 para trabalhar numa editora de livros infantis, mas acabou fazendo apenas uma capa para a empresa, sendo logo contratado pelo estúdio Eisner e Iger, que já trabalhava com artistas respeitados como Lou Fine, Paul Gustavson, Alex Kotsky, Fred Gardineer e, é claro, Will Eisner, um dos fundadores do estúdio. Foi a partir desse período que Reed Crandall passou a trabalhar diretamente com quadrinhos.

 

Primeiros trabalhos

Seus primeiros trabalhos foram para a Quality Comics onde inicialmente atuou como artefinalista para as capas de Lou Fines na revista Military Comics. Mas logo o editor Everett M. Arnold percebeu a qualidade do trabalho de Crandall e o colocou para desenhar. A primeira hq que ilustrou foi Hit Comics #10 e, apartir daí, rapidamente passou a ser reconhecido por seu realismo e detalhismo anatômico. Na Quality Comics, desenhou principalmente super-heróis como The Ray e Doll Man.

Neste período, também trabalhou em capas para a editora Fiction House e ainda criou, junto com Jerry Iger, o personagem Firebrand para a revista Police Comics (que também publicara Plastic Man e Spirit), além de ter sido desenhista do personagem Captain Triumph. As ilustrações de Crandall chamaram atenção por apresentarem um estilo mais realista que o tradicional estilo cartunizado, mais comum na época. Sua contribuição mais lembrada neste período foi seu trabalho para a revista Military comics, onde desenhou por mais de 10 anos as histórias do grupo de aviadores Blackhawks (com um hiato quando precisou servir o exército).

Além da Quality, Reed Crandall também trabalhou para a Atlas Comics (precursora da Marvel), fazendo a arte-final para Jack Kirby em algumas histórias do Capitão América e atuando como ilustrador freelancer para diversos outros títulos.

Nos anos 50, já profissionalmente estabelecido na indústria, Crandall desenhou para a E.C Comics, especialmente para as antologias de horror e sci-fi da editora. Sua primeira história para a E.C foi “Bloody Sure”, publicada em Haunt of Fear #20, de 1953. Reed Crandall trabalhou também em Tales From the Crypt, Two-Fisted Tales, Vault of Horror, Crime SuspenStories e Weird Fantasy, entre outros, até o fim da editora em função do Comics Code Authority.

Com o fim tanto da Quality quanto da E.C., Crandall teve que buscar trabalho em outras editoras, mantendo seu trabalho ocasional na Atlas e agora também no novo selo da época, Marvel. Nos anos 60, o artista chegou a assinar um contrato com o Catholic Guild, que publicava Treasure Chest, uma hq bissemanal distribuída exclusivamente nas escolas paroquiais. Desenhou para a Treasure Chest até o início dos anos 70, principalmente histórias sci-fi protagonizadas pela “Polícia Interplanetária”.

 

Warren Publishing e além

Ainda nos anos 60, Reed Crandall ilustrou diversas antologias da Gold Key, como Believe It or Not, Boris Karloff, Tales of Mystery e The Twilight Zone. Mas foi a partir de 1964 que Crandall encontrou sua nova casa, a Warren Publishing.

Reed Crandall trabalhou para a Warren até o início dos anos 70, tendo ilustrados diversas histórias para as antologias de horror Creepy e Eerie, além da antologia de Guerra Blazing Combat.

Neste período, Crandall chegou a produzir etiquetas e capas de livros para a Canaveral Press, que possuía títulos de personagens como Tarzan e John Carter. A editora também contava com Frank Frazetta em sua linha de ilustradores, mas infelizmente encerrou as atividades antes que muitas das ilustrações de Crandall pudessem ser utilizadas.

Ainda nos anos 60, Crandall também trabalharia para títulos de espionagem da Thunder Comics, em especial para T.H.U.N.D.E.R. Agents e Dynamo, onde trabalhou junto com o ícone dos comics Wally Wood. Em 1967, passou a ilustrar as aventuras de Flash Gordon para o King Features Syndicate.

 

Últimos anos

Infelizmente, a vida pessoal do artista foi problemática em seus últimos anos. Quando sua mãe ficou terrivelmente doente, teve que voltar para seu estado natal para cuidar dela, ficando relativamente isolado do mercado, o que acabou levando-o para o alcoolismo. Crandall conseguiu se livrar do vício antes da morte de sua mãe, mas não sem ter como sequelas uma saúde debilitada e prejuízos no seu ritmo de produção. Sua última história publicada foi “This Graveyard is Not Deserted”, de Creepy #54, publicada em 1973.

Em 1974, Reed Crandall se aposenta dos quadrinhos e passa a trabalhar como vigia e zelador em um restaurante da rede Pizza Hut. No mesmo ano, o artista sofre um derrame e passa a viver em uma casa de repouso, onde permaneceu até seus últimos dias. Reed Crandall faleceu em 1982, vítima de um ataque cardíaco.

Com um estilo mais realista e anatomicamente detalhado, Reed Crandall se desviou da tradição do desenho de quadrinhos, cujo estilo mais cartunesco era o paradigma vigente, e definiu um estilo que até hoje merece ser lembrado e reverenciado.

 

Curiosidades:
– Na Quality, Reed Crandall desenhou as aventuras do herói The Ray sob o pseudônimo de E. Lectron;
– Uma das ilustrações de Crandall feita para a história “The Corpse That Came to Dinner”, publicada na revista Out of the Shadows #9, foi mencionada no livro “The Seduction of the Innocent”, considerado o ponto de partida para a perseguição aos quadrinhos que levou à adoção do Comics Code;
– Boa parte do trabalho que Reed Crandall fez para a Canaveral Press só ganhou a luz do dia graças à Russ Cochran, que utilizou ilustrações do autor para a coleção Edgar Rice Burroughs Library of Illustration Vol. 3 (1976) e Richard Lupoff, que organizou a coleção Edgar Rice Burroughs: Master of Adventure (1964);
– Reed Crandall é citado em The Amazing Adventures of Kavalier & Clay, onde o personagem fictício Joe Kavalier se refere ao artista como “o maior artista de quadrinhos da sua era”;
– Em 2009, Reed Crandall foi incluído no The Will Eisner Award Hall of Fame.

 

Edições anteriores:

43 – Skywald Publications e o clima de horror

42 – Vampirella

41 – O Homem Coisa

40 – Os quadrinhos de terror no Brasil: Criadores e Criaturas

39 – Os quadrinhos de terror no Brasil: parte 2

38 – Os quadrinhos de terror no Brasil: parte 1

37 – Apresentadores de terror (Horror Hosts)

36 – Dylan Dog

35 – Monstro do Pântano (parte 2 de 2)

34 – Monstro do Pântano (parte 1 de 2)

33 – Criadores de Terror: Bernie Wrightson

32 – Super-heróis com um “pé” no terror: Doutor Estranho

31 – Os 70 anos de Eerie #1

30 – Plantão Sarjeta do Terror – Sombras do Recife

29 – Criadores de Terror: Rodolfo Zalla

28 – Da TV para os quadrinhos: Além da imaginação

27 – Vigor Mortis Comics – Volume 1

26 – Super-heróis com um “pé” no terror: O Espectro

25 – Warren Publishing: Contornando o Comics Code

24 – Prontuário 666, os anos de Cárcere de Zé do Caixão

23 – Da TV para os quadrinhos: Arquivo X

22 – Criadores de Terror: Eugenio Colonnese

21 – Terror nas grandes editoras, parte final

20 – Terror nas grandes editoras, parte 2

19 – Uzumaki

18 – Terror nas grandes editoras, parte 1

17 – Do cinema para os quadrinhos: Evil Dead/Army of Darkness

16 – Terror no mundo real: o Comics Code Authority, parte final

15 – Super-heróis com um “pé” no terror: Doutor Oculto

14 – Terror no mundo real: o Comics Code Authority, parte 1

13 – Da TV para os quadrinhos: Elvira, a Rainha das Trevas

12 – EC Comics , epílogo: O Discurso Contra a Censura

11 – Criadores de Terror: Salvador Sanz

10 – EC Comics, parte 3: o fim

9 – Super-heróis com um “pé” no terror: Homem Formiga

8 – Interlúdio: Shut-in (trancado por dentro)

7 – EC Comics, parte 2: o auge

6 – Interlúdio: Garra Cinzenta, horror pulp nacional

5 – EC Comics, parte 1: o início

4 – Asilo Arkham: uma séria casa num sério mundo

3 – A Era de Ouro dos comics de terror

2 – Beladona

1 – As histórias em quadrinhos de terror: os primórdios

Autor: Amanda Paiva

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