Sarjeta do Terror # 33 – Criadores de Terror: Bernie Wrightson

Neste Sarjeta do Terror, conheça um pouco sobre Bernie Wrigthson, grande artista dos comics, que faleceu em março deste ano.

Em 18 de março de 2015, faleceu Bernie Wrightson (às vezes grafado Berni Wrightson), uma das figuras mais celebradas dos comics em geral e, em particular, dos comics de terror. Com um dinamismo e um estilo inconfundível, Wrightson trabalhou nas principais editoras e com personagens clássicos, de super-heróis a monstros, além de ser responsável pela criação daquele que seria um dos principais personagens de terror da DC Comics. Confira um pouco da história deste autor.

Os primeiros anos

Wrightson nasceu em 1948 e foi praticamente um autodidata nos quadrinhos. Aprendeu sobre arte pela TV (através do programa “You Are an Artist?”, apresentado por Jon Gnagy), lendo quadrinhos e também através de um curso por correspondência (a versão analógica da EAD). Suas influências desde o começo foram os quadrinhos de horror da EC Comics e os artistas Frank Frazetta (que dispensa apresentações) e Graham Ingels, conhecido por seus trabalhos em The Haunt of Fear and Tales from the Crypt.

A carreira do artista começou em 1966, trabalhando como ilustrador para um jornal de Baltimore, mas não demoraria muito para ele pular para os quadrinhos. Um ano depois, ele conheceria um dos seus ídolos, Frank Frazetta, numa convenção de quadrinhos e ficaria inspirado a produzir suas próprias HQs.

Em 1968, ele já começava a trabalhar profissionalmente com quadrinhos, com sua primeira história desenhada na edição 170 de House of Mystery, da DC Comics. A partir daí, nunca mais parou.

Monstro do Pântano

Junto com roteirista Len Wein, Wrightson é responsável pela criação do Monstro do Pântano, um dos personagens mais importantes da DC Comics e um dos responsáveis pelo surgimento do selo Vertigo. Wein conta que conversava com Wrightson quando o artista havia recém rompido com a sua namorada, e comentou ter uma história que parecia refletir o que ele estava sentindo. Ao ouvir sobre a história, conta Wein, Wrightson quis desenhá-la a qualquer custo.

A história, publicada em House of Secrets # 92 em 1972, era um one-shot (história única) passado na era vitoriana, sobre um homem traído pelo melhor amigo que revive como uma criatura do pântano, apenas para se ver impossibiltado de retornar à sua amada. A história fez tanto sucesso que ganhou uma revista própria, com origem revitalizada para os tempos atuais (da época, claro). Wrightson desenhou as 10 primeiras histórias da HQ (mais sobre o personagem em matéria futura).

 

A fase Warren e o estúdio próprio

Em 1974, Bernie Wrightson deixou a DC para trabalhar na Warren Publishing, trabalhando tanto em histórias originais quanto em adaptações. Adaptou, entre outras coisas, “Cool Air”, de H.P. Lovecraft, e “O Gato Preto”, de Edgar Allan Poe, e entre histórias originais desenhou “Jenifer”, escrita por Bruce Jones e que décadas mais tarde seria adaptada para um segmento da antologia “Masters of Horror”, dirigido pelo grande nome do cinema de horror italiano, Dario Argento.

Um ano depois, Wrightson se uniu aos artistas Jeffrey Catherine Jones, Michael Kaluta e Barry Windsor-Smith para fundar “The Studio”, que era basicamente um loft compartilhado em Manhattan onde eles produziriam arte fora das restrições dos comics mais comerciais. Nisso, Wrightson produziu arte para posters, prints, calendários e inclusive para um livro de colorir superdetalhado, além de quadrinhos esporádicos e ilustrações para a revista de humor National Lampoon, entre 1973 e 1983.

Outros trabalhos

Seu personagem, “Capitão Stern”, publicado na Heavy Metal em 1980, foi adaptado para a animação baseada na revista. Em 1982, Wrightson se uniria novamente a Bruce Jones para ilustrar “Freakshow”, graphic Novel publicada na espanha e posteriormente lançada de forma serializada na Heavy Metal. Em 1983, Wrightson lançaria uma de suas obras mais conhecidas: a versão ilustrada de Frankenstein, publicado pela Marvel.

Wrightson também desenhou a adaptação em quadrinhos de Creepshow, antologia de horror de Stephen King inspirada nas clássicas HQs de terror dos anos 50. Esta parceria rendeu frutos e levou o artista a outras colaborações com o escritor, como ilustrações em “A Hora do Lobisomem”, na edição restaurada de “A Dança da Morte” e no quinto livro da série A Torre Negra, “Lobos de Calla”. Além disso, também produziu uma ilustração para o TV Guide sobre a minissérie de King que adaptou seu romance “O Iluminado”.

Ainda nos anos 80, Wrightson se uniu a Jim Starlin para produzir duas HQs beneficientes:“Heroes for Hope” para a Marvel Comics, em 1985, que buscou arrecadar dinheiro para a fome na África e contou com uma lista de grandes autores, entre eles Stephen King e George R. R. Martin; e Heroes Against Hunger para a DC Comics, em 1986, protagonizada por Superman e Batman.

Starlin e Wrightson ainda colaborariam em “The Weird”, personagem criado por Jim Starlin (e visto por aqui nas histórias da Liga da Justiça Internacional, no início dos anos 90); a clássica Batman: O Messias; e a também clássica Marvel Graphic Novel #29, unindo Hulk e o Coisa, tudo isso em 1988. Para a Marvel também ilustraria, anos mais tarde, o Justiceiro “anjo da morte” (uma fase do personagem que, felizmente, foi basicamente esquecido na continuidade).

Na década mais recente, Wrightson fez o design de produção para personagens de “Serenity”, filme de Joss Whedon de 2005 e baseado na série “Firefly”, além de colaborar com Steve Niles em “Frankentein Alive, Alive!” para a IDW em 2012.

Bernie Wrightson inspirou muitos outros artistas que vieram e sempre foi fiel aos quadrinhos, mesmo quando buscou outras mídias. Só parou de trabalhar em janeiro de 2017, dois meses antes do seu falecimento, quando se aposentou para tratar-se de câncer. faleceu em 18 de março, deixando a indústria de quadrinhos de luto, mas com um legado que nunca será esquecido.

Curiosidades:
– No início da carreira, Wrightson começou grafar seu nome como “Berni” ao invés de “Bernie” para evitar confusões com um nadador olímpico de mesmo nome. Apenas mais tarde é que o autor voltou a assinar seu nome original – é por isso que há duas grafias diferentes para o nome do autor;
Michelle Wrightson, primeira esposa do artista, contribuiu com histórias para Underground Comix, revista satírica que revelou diversos artistas underground (entre eles Robert Crumb) e pode ser considerado um pontapé inicial para a popularização dos quadrinhos alternativos. Michelle faleceu em 2015;
– Wrightson é criador, junto com Marv Wolfman, do personagem Destino, que apareceu em Weird Mystety Tales #1 e, mais tarde, seria usado nos trabalhos de Neil Gaiman com o Universo do Sandman;
– Wrightson chegou a dividir apartamento com Al Milgrom, Howard Chaykin e Walter Simonson no Queens (NY);
– Em “Bart Simpsons’s Treehouse of Horror” #11, HQ dos Simpsons no estilo dos espisódios de Halloween da série animada, Wrightson trabalhou junto com Len Wein na história “The Squish Thing”, que era uma paródia do Monstro do Pântano.

Edições anteriores:

32 – Super-heróis com um “pé” no terror: Doutor Estranho

31 – Os 70 anos de Eerie #1

30 – Plantão Sarjeta do Terror – Sombras do Recife

29 – Criadores de Terror: Rodolfo Zalla

28 – Da TV para os quadrinhos: Além da imaginação

27 – Vigor Mortis Comics – Volume 1

26 – Super-heróis com um “pé” no terror: O Espectro

25 – Warren Publishing: Contornando o Comics Code

24 – Prontuário 666, os anos de Cárcere de Zé do Caixão

23 – Da TV para os quadrinhos: Arquivo X

22 – Criadores de Terror: Eugenio Colonnese

21 – Terror nas grandes editoras, parte final

20 – Terror nas grandes editoras, parte 2

19 – Uzumaki

18 – Terror nas grandes editoras, parte 1

17 – Do cinema para os quadrinhos: Evil Dead/Army of Darkness

16 – Terror no mundo real: o Comics Code Authority, parte final

15 – Super-heróis com um “pé” no terror: Doutor Oculto

14 – Terror no mundo real: o Comics Code Authority, parte 1

13 – Da TV para os quadrinhos: Elvira, a Rainha das Trevas

12 – EC Comics , epílogo: O Discurso Contra a Censura

11 – Criadores de Terror: Salvador Sanz

10 – EC Comics, parte 3: o fim

9 – Super-heróis com um “pé” no terror: Homem Formiga

8 – Interlúdio: Shut-in (trancado por dentro)

7 – EC Comics, parte 2: o auge

6 – Interlúdio: Garra Cinzenta, horror pulp nacional

5 – EC Comics, parte 1: o início

4 – Asilo Arkham: uma séria casa num sério mundo

3 – A Era de Ouro dos comics de terror

2 – Beladona

1 – As histórias em quadrinhos de terror: os primórdios

Monstro do Pântano – Raízes Volume 1 [resenha]

“Wish I was back on the Bayou
Rolling with some Cajun Queen
Wishing I were a fast freight train
Just a choogling on down to New Orleans”

– Born on the Bayou, Creedance Clearwater Revival

mp-rv1Quem conhece um pouco da história das HQs sabe que durante a conturbada década de 50, o país do Mississipi foi alvo do Comic Code Authority. Um selo que, estampado nas capas das revistas, regulamentava as publicações infanto-juvenis na América. Essa regulamentação modificava o conteúdo dos roteiros, proibia o uso de certas palavras e limitava até mesmo as cores empregadas na revista.

Essa ação aconteceu após o lançamento do livro Sedução do Inocente (de Frederic Wertham) que associava as histórias em quadrinhos a atos de violência juvenil e também graças ao fato de que os leitores americanos da época estavam deixando de lado os aventureiros uniformizados para ler gibis com uma temática mais pesadas e com temas adultos que incluíram principalmente a violência urbana e o terror. Alguns exemplos de títulos dessa época incluem The House of Secrets e The House of Mystery (DC Comics) e Mister Mystery.

Pois bem, eis que o recente encadernado da Panini Comics (que chegou as bancas brasileiras em Maio do último ano) é um regate ao horror proposto pelas revistas citadas. Monstro do Pântano Volume 1: Raízes, reúne as seis primeiras edições de Swamp Thing junto com uma aventura em oito páginas publicada em The House of Secrets #92. Mas calma que já explico o porquê de o herói pantanoso fazer referências aos clássicos do terror.

 

 As Raízes quadrinhesca do Monstro do Pântano

monstro_do_pantano_raizes_02Apesar de ter sido publicado em 1971 (muito depois da regulamentação dos gibis) a proposta narrativa do roteiro de Lein Wein foi ousada para a época e arte assombrosa de Bernie Wrightson (Batman – O Messias) causa espantos e referencia os filmes da Hammer.

Nos primeiros capítulos, somos apresentados ao botânico Alec Holland, responsável pelo desenvolvimento de uma formula biorestauradora que servirá para acabar com muitos males do mundo. Mas uma organização interessada em lucrar em cima desse novo composto busca pelo esconderijo do cientista e o encontra num bayou da Louisiana.

Infelizmente, o confronto entre o botânico e o grupo resulta em perdas: A esposa de Holland é assassinada e após uma explosão do laboratório, Allec recebe resíduos da substância e é arremessado num pântano – de onde renasce como o Monstro do Pântano.

A história faz referência ao terror gótico típico de romances da época vitoriana. Principalmente ao Dracula, e O Médico e o Monstro. O ser pantanoso é uma criatura melancólica em busca de aceitação e vingança, além sofrer de uma pesada síndrome de Frankstein: Em um dos momentos mais marcantes a coisa, ao refletir sobre sua nova condição, sofre um choque ao perceber que de fato ele é um Morto-vivo.

Além de ter que lidar com a organização governamental. Toda uma sorte antagonistas entram em cena. Entre eles estão os Não-Homens, o mago Anton Arcane e até mesmo um lobisomem. O traço sombrio de Wrighton vemos uma diferença marcante entre os homens normais (com traços bem definidos) e as monstruosidades.

Ao leitor novato, cabe um alerta: O texto é bastante arrastado. Isso é característica da maneira como os quadrinhos eram escritos na época. São balões com muitas letras e quadros com as falas do narrador que reproduzem exatamente o que se vê no desenho. Mesmo com essa linguagem, ler esse clássico é imprescindível para conhecer as raízes de um dos selos de quadrinhos mais importante: A Vertigo.

A Saga de Alan Moore

mosntro_do_pantano_raizes_04 No Brasil, a chegada desse volume com contos somente antes publicados em periódicos da editora Ebal elevou a empolgação dos fãs. Diversos sites internet afora especulam que após essas edições com os autores originais de Monstro do Pântano, a Panini deverá seguir publicando a renomada saga escrita por Alan Moore. Isso principalmente pelo fato de Raízes ser semelhante ao encadernado com papel jornal de Hellblazer: Origens – que já se encontra na sexta edição.

A editora não confirmou a série do escritor inglês, mas já anunciou para outubro desse ano o lançamento do segundo volume do herói verde. Até o momento, nem mesmo a capa foi apresentada no site da empresa. Só me espanta que a saga de Len Wein tenha apenas 12 edições. Em nome dos fãs afirmo que esse álbum foi uma bola dentro da Panini e que pode ser a semente que irá germinar em uma nova série nas bancas.

Ficha Básica – Clássicos DC Monstro do Pântano Raízes: Volume 1; Formato: 17x26cm, Capa com lombada quadrada; papel Pisa brite; 164 páginas; Compreende The House of Secrets #92 e Swamp Thing 1-6.